domingo, 30 de agosto de 2009




As modificações da silhueta ao longo da carreira somente se justifica pela prioridade do exercício de pensar.

Talvez seja a justificativa para tentar explicar deficiências. Torcemos argumentos para adequar à realidade. Todavia mais fácil recuperar a forma física que livrar-se do alemão perverso Alzheimer. Logo pensar é preciso, e muito.

Recentemente tenho me dedicado a estudar desempenho, avaliação de desempenho, meritocracia e igualdade. O interesse certamente surgiu em decorrência do curso de pós-graduação da FGV que se encaixou no projeto do plano de carreira da PMDF.

Garimpando a literatura recorri a mais de uma dezena de livros sobre o tema desempenho e me deparei com o livro “Igualdade e Meritocracia” de Lívia Borges, editado pela Editora da FGV. Um primor de livro que cuida da ética do desempenho nas sociedades modernas.

A reflexão que se pode fazer a partir desse tipo de estudo substitui uma série de sessões de psicoterapia. Digo isso porque comparando com a experiência de haver participado da comissão e relatoria do PCS da PMDF já estava me sentindo culpado por haver logrado atingir o topo da minha carreira na PMDF, como se isso fosse um privilégio oriundo de mecanismos distorcidos e que, portanto deveriam provocar constrangimentos e vergonha. O que deveria ser motivo de orgulho, reconhecimento social pelo desempenho acaba sendo um fator de desconfiança e ataques.

Assim é preciso deixar claro que não há razão para não ter orgulho da profissão e de minha condição atual. Cheguei a Coronel da PMDF e isso me é muito caro. O estágio atual me confere satisfação e muitas responsabilidades. Não há necessidade, portanto, de se adotar posturas tímidas e secretas como a do jogador que fez um gol de mão.

Uma explicação para esse estado de constrangimento é que querem assassinar a meritocracia no âmbito da PMDF sob o pretexto de igualdade. Estão querendo demolir este importante pilar do genuíno pensamento democrático do país.

Um dos pontos mais atacados na construção do projeto de carreira foi o instituto da promoção por merecimento. Eliminaram-no sob o argumento de que distorções foram cometidas ao longo de sua aplicação, e foram, mas que está absolutamente na contramão do pensamento da sociedade. Quiseram instituir somente o mérito da senioridade. Importação do modelo japonês fora de contexto.

Como explica Lívia Barbosa em seu livro a meritocracia possui duas acepções: uma negativa e outra afirmativa. A negativa é evidenciada pela rejeição a todo e qualquer privilégio decorrente de questões hereditárias e corporativas e que valoriza e avalia as pessoas independentemente de suas trajetórias e biografias sociais. Esse sentido negativo não atribui importância a variáveis sociais como origem, posição social e econômica e poder político no momento em que se pleiteia um cargo. O sistema que se defende é o da aristocracia de talentos que contrapõe privilégios hereditários e ideais democráticos atuais. Certamente este é o ponto de consenso social.
Do ponto de vista afirmativo concebemos meritocracia como sendo o critério básico de organização social e institucional segundo o qual deve ser valorizado o desempenho das pessoas, o conjunto de talentos, habilidades e esforços. Nesse ponto, especificamente, é que deixa de haver consenso do que seja meritocracia. Os critérios passam a ser excludentes.

Nesse ambiente de conflito, gerado pela percepção diferente dos critérios surge a proposta sedutora de igualdade. Mas igualdade não é um conceito absoluto. Podemos para melhor definir esse fenômeno nos socorrer do conceito de justiça que é: “o de tratar os desiguais desigualmente no limite de suas desigualdades.” Todavia a tendência é de se querer tornar absoluto o conceito, simplificar a estratificação e subverter o consenso e as normas. Por isso torna-se necessário buscar fundamentos culturais do conceito de igualdade na sociedade brasileira.

Diferentemente dos Estados Unidos que construiu seu ideário de desempenho em cima do conceito da igualdade de oportunidades o Brasil foi construído em cima de privilégios de aristocracia hereditária. Foi D. Pedro I quem primeiro manifestou na Constituição de 1824 a noção de desempenho para ingresso no serviço público, que no artigo 179, inciso XIV preconizou: “Todo cidadão pode ser admitido aos cargos públicos civis, políticos e militares, sem outra diferença que não seja por seus talentos e virtudes.” Começa aí a luta contra as nomeações nepóticas e fisiológicas.

O sistema da PMDF obedece a esse princípio de igualdade de oportunidades, e disso ninguém há de questionar. Qualquer pessoa que satisfaça as condições preconizadas para o desempenho dos diversos cargos existentes na instituição poderá desempenhá-los. Os critérios para atingi-los são os que ao final estabelecem talentos e virtudes para tal. Logo, se uma pessoa faz concurso para a PMDF, ingressa na corporação, realiza os cursos que se constituem em requisitos para a carreira, se conduz ao longo de sua vida profissional de acordo com os padrões que lhe são exigidos galgará os cargos que são possíveis ao seu desempenho. Ocorre que esse padrão de desempenho por vezes é esquecido e o foco fica sendo a obtenção de benefícios. Ou seja, o que quero chamar a atenção é que existe uma preocupação em se atingir os mesmos benefícios de todos sem a contrapartida do desempenho.

De alguma maneira sub-reptícia ficam vendendo a imagem de que a carreira de oficial é feita somente de privilégios. É a típica afirmativa maldosa, covarde, distorcida e que serve aos objetivos de fragmentar a estrutura organizacional para o seu controle político.

A hierarquização da organização é a estrutura necessária para que possa funcionar. O sistema exige diferentes níveis de execução, gestão, planejamento, etc. Isso, contudo, não faz das pessoas diferentes em seus direitos, mas o conjunto de talentos e habilidades de cada um é o que o posiciona nessa estrutura. Desde que uma pessoa perfaça o processo necessário, enfim cumpra os requisitos exigidos para a carreira e agregue valor do seu desempenho e esforço, ela poderá chegar a ser o Comandante-Geral. Logo existe igualdade de oportunidades para essa mobilidade social dentro da organização. Ademais, importante evidenciar que existem milhares de casos de ascensão profissional que são tipicamente resultados de esforços individuais e talentos. Oficiais que foram soldados não são casos raros.

Bem, essa conversa se deixar vai longe.

Tenho certeza de que haveremos de debater muito sobre o assunto, e em breve contarei com a sua participação em uma pesquisa que estou elaborando para diagnosticar o sistema de avaliação de desempenho na PMDF e com isso orientar o seu aprimoramento, tão logo o PL 5664/2009 seja aprovado.

Concluindo: o importante é não perder o foco do que somos e como nos organizamos. Desvalorizar nossos talentos é a forma eficaz de aniquilar a instituição. É bem possível que isso se preste a interesses escusos. Precisamos ficar atentos e lutar contra esses ataques preconceituosos.

Bom domingo e que o Fluminense vença POR MÉRITO!

Fraternal abraço,

Ricardo Martins




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