sexta-feira, 31 de julho de 2009



O dia 30 de junho de 2009 amanheceu frio e seco em Brasília prenunciando o clima de ressaca.

O Diário Oficial da União publicou o despacho 608 do Presidente da República, noticiando que o Plano de Cargos e Salários da PMDF segue para o Congresso Nacional sob a forma de anteprojeto de lei.

Na PMDF o sentimento é de frustração, desilusão, angústia e derrota em razão das expectativas depositadas na Medida Provisória. Um amigo definiu o clima de consternação e perplexidade como a do “campeão moral” de um time de futebol, que ganha, mas não leva.

Nesse quadro surgem as manifestações de indignação, tentativas de explicação, teorias de conspiração e tudo mais que possa mitigar o desânimo.

Todos querem externar de algum modo sua indignação e decepção. Assim o tema das conversas entre policiais militares: plano de carreira. Outros se animam a criar um blog, assim como eu, para registrar suas idéias e compartilhar o sentimento de derrota. Nesse contexto surgem os tipos característicos de sempre.

Os irascíveis e desequilibrados giram suas metralhadoras a atiram para todo lado querendo atingir um pretenso culpado por tudo. Há um caso de um suposto “Major Maneiro”, que criou blog anônimo para destilar seu veneno. Não deve ser major nem é maneiro, porque major não se esconde atrás de anonimato, não é digno de um oficial superior que se julga ético e comprometido, e um sujeito maneiro é racional e analisa o que está acontecendo e não sai por aí detratando a tudo e a todos por suas frustrações pessoais. Ademais o anonimato é relativo já que o IP do computador é identificado no blog. Portanto devemos ter cuidado com o que dizemos sob o vil manto do anonimato, pois ele pode nos trair diante de uma inequívoca demonstração de desequilíbrio e imaturidade. Isso não favorece o debate porque não se sabe com quem estamos dialogando. Esses casos demonstram a típica situação do sujeito que culpa o sofá pelo adultério para justificar sua condição. Tais pessoas normalmente têm auto-estima baixa, são egocêntricas e pensam com o fígado.

Os abutres identificam a oportunidade para se dar bem diante do quadro de desolação. Os motivos são vários desde projetos políticos pessoais até a vingança por razões mesquinhas. Esses já estão imaginando o que fazer para complicar mais a situação, apresentando propostas indecorosas somente para tumultuar o processo. Para eles o lema é: “quanto pior melhor”, para seus propósitos individuais.

“Os analistas políticos” de plantão possuem cada qual uma explicação. Algumas já ouvidas por aí ontem: “É claro que o Governo Federal, que é do PT, não iria facilitar o processo que favoreceria o governo local que é do DEM. Ano que vem tem eleição e o candidato do PT é quem vai faturar politicamente o plano.” Outra: “O Governador vai renunciar para ser candidato na chapa do Aécio ou Serra. O Vice-Governador assume. E o candidato ao Governo do DF nas próximas eleições será o Tadeu Filipelli, cujo rompimento com o Ex-Governador Joaquim Roriz é pura fachada. Fillipeli será o relator do PCS para alavancar sua candidatura.” Mais uma: “Essa coisa de PL é mentira. Semana que vem o Governo Federal vai retirar o projeto e apresentar a Medida Provisória, porque o Presidente quer que a PMDF apóie a Ministra Dilma para as próximas eleições.” Assim como essas análises, várias outras, cujo foco, um tanto egocêntrico, é de que tudo que acontece ou vai acontecer no meio político Nacional e do Distrito Federal passa pelo plano de carreira dos militares do DF.

Há também os identificadores de teorias de conspiração. Dentre essas teorias está a de que as Forças Armadas conspiram para que tudo dê errado para a PMDF; que a Polícia Civil está desestabilizando todas as ações; que isso e aquilo e tanta coisa mais.

Há os sensíveis: “ninguém me ama ninguém me quer” e suas variantes.

Enquanto isso o projeto já seguiu para o Congresso.

Consegui o texto do plano e a mensagem que seguiram para analisar o que devemos fazer de agora em diante. Enviei o texto para a PMDF e CBMDF e solicitei que fosse colocado nos sites das corporações. Temos que analisar o cenário, identificar nossos pontos fortes e fracos, oportunidades e ameaças. Precisamos conter as interferências, isolar os objetivos e negociar com os atores do processo. Ou seja, devemos empregar a matriz de análise estratégica e a doutrina de gerenciamento de crises.

Assim como qualquer policial militar comungo do sentimento de frustração e desapontamento em razão das esperanças que também depositei na possibilidade da medida provisória. Só que acho que me enquadro no universo daqueles que entendem que a guerra não está perdida embora o caminho seja mais longo e penoso. Não dá para sentar na beira do caminho e chorar, resmungar. Temos que arregaçar as mangas e lutar pelo que queremos, pois ao final, quando o sucesso chegar, e ele vai chegar, o sentimento de conquista será muito maior. Existe um objetivo a ser atingido e está mais próximo que antes. Etapas foram vencidas (esse projeto não padece de vício de iniciativa por exemplo), mas há outras não menos importantes. Diante dos problemas há os que se desesperam e se desequilibram e os que identificam desafios e oportunidades.

Que tal uma boa dose de racionalidade e otimismo para curar a ressaca?!
O que temos hoje é um projeto de lei que pode se transformar em uma lei.
O que queremos está nesse projeto, devemos conquistar esse objetivo.

Ah, um desafio para você: leia o plano e verifique se não vale a pena lutar.



Fraternal abraço,

Ricardo Martins.

quarta-feira, 29 de julho de 2009


Resumo da ópera:

1. GDF encaminha projeto e pugna por Medida Provisória.
2. Ministério do Planejamento audita processo e concorda com Medida Provisória.
3. Técnicos da Casa Civil da Presidência auditam o processo e opinam que o projeto deva ser encaminhado por Projeto de Lei considerando a previsão dos artigos 246, 42, 142 da Consituição Federal, combinados com a Emenda Constitucional nº 18.
4. Técnicos da comissão do GDF pugnam pela edição da Medida Provisória, considerando que as medidas provisórias de números 441, 440, 434, 431, 401, 389, 308, 306, 305, 304, 302, 301, 295, 283, 224,2215 e outras foram editadas e se enquadram no mesmo tipo de vedação constitucional alegada pela Casa Civil.
5. Casa Civil reconhece o argumento e se compromete a preparar dois projetos (de Lei e de Medida Provisória) para serem submetidos ao Presidente da República. Realmente prepararam conforme nos enviaram.
6. Governador do DF faz gestões junto ao Governo Federal pugnando pela edição de Medida Provisória.
7. Em 29 de julho o projeto vai a despacho com o presidente e a despeito de toda argumentação o projeto vai ser tratado por projeto de Lei.

Cenário:

1. Não é a primeira vez que assuntos referentes aos militares do DF são tratados por projeto de lei. A Lei 11.134 de 2005 foi fruto do Projeto de Lei 5030;
2. Resta saber se para o projeto foi solicitado regime de urgência;
3. O texto da lei satisfaz aos anseios dos militares do Distrito Federal (leiam o PL);
4. O clima no congresso não favorece o andamento do projeto (PEC 300, PEC 352, parlamentares dos ex-territórios, CPIs, crises, etc....)
5. Ruim haver seguido por projeto de lei ao invés de medida provisória, pior se não houvesse projeto algum nem expectativas de mudanças.
6. Não adianta chorar o leite derramado.

Ações necessárias:

1. Temos que pressionar a bancada do DF no sentido de colocar na pauta o projeto o mais rápido possível;
2. Agora é o momento de mobilizar todas as nossas forças políticas, lobbies, pressões e tudo que for possível para terminar o que falta;
3. Temos que cerrar sobre o relator do projeto no congresso para colocar o tema na ordem do dia.
4. Vamos vigiar as próximas Medidas Provisórias editas pelo Executivo Federal para constatar se tivemos tratamento diferenciado.

É este o resumo. Essas são as regras do jogo. Todos sabíamos que esta era uma das possibilidades.

sexta-feira, 24 de julho de 2009


Recebi uma mensagem do CB G Gomes que me pediu para comentar a notícia de contenção de gastos com pessoal pelo GDF e os possíveis reflexos no nosso plano de carreira.

O DFTV, na intenção de contextualizar a matéria, mostrou a carreata de policiais militares que, em tese, reivindicavam aumento de salário. Produziu um samba- do-crioulo-doido.

De fato o GDF vem controlando seus gastos em razão da reavaliação das receitas obtidas. Desde a crise internacional todas as despesas estão sendo reavaliadas, principalmente para não descumprir preceitos das Lei de Responsabilidade Fiscal. Essa é uma realidade de todos os governantes. O próprio Presidente da República já havia editado norma semelhante de contenção de gastos no âmbito federal.

O caso específico do PCS dos militares do Distrito Federal já superou este entrave. Quando da elaboração do plano o impacto financeiro e orçamentário foram considerados aspectos fundamentais, sem os quais não há possibilidade sequer do plano ser apreciado.

No primeiro momento, bem lá no início, não havia delimitação deste impacto e o plano não avançava. Foi somente com a intervenção do Governador, que conhecedor das condições das receitas correntes líquidas do Distrito Federal (ele sabe isso de memória), estabeleceu-se a possibilidade de um impacto de até 5% na folha da PMDF e do CBMDF e o plano pôde seguir em frente.

O impacto previsto já está planejado pela área econômica do governo, bem como foi avaliado à luz do Fundo Constitucional do Distrito Federal, sendo ratificado pela federal. Tudo isso está no processo. Logo, as consequências financeiras do plano já estão previstas e acordadas entre o GDF e a União. O PCS só está sendo editado, espero que por esses dias, em razão de haver superado toda essa análise financeira, o que significa que as medidas de contenção se referem à futuras proposições.

No que tange a contratação de pessoal, o raciocínio é o mesmo. Todavia gostaria de dividir a seguinte estratégia: para que se obtenha melhoria de benefícios e remuneração, quanto maior o efetivo, mais difícil obter vantagens em razão do impacto. É preciso estabelecer a estratégia de desenvolver ao invés de crescer, o que significa que teremos que produzir mais com o mesmo efetivo, ou seja, atingir índices de eficácia e efetividade. Aí entra a questão da gestão e de outras estratégias de ação policial. Aumentar efetivo e benefícios não são ações que se coadunam.

Entretanto isso não quer dizer que não se busque o recompletamento em razão das baixas. É necessário também uma política de recompletamento gradual, planejado. Por exemplo: o último ingresso na corporação ocorreu em 2003. Lá se vão seis anos sem que ninguém tenha sido contratado para recompletar os claros em decorrência de passagem para reserva, exclusões, mortes, etc. A média anual de saídas é da ordem de 350 policiais militares. É só fazer as contas e verificar o prejuízo que essa retenção causa, principalmente se considerarmos que a demanda por segurança é uma curva crescente.
Quando a situação se agrava vem a decisão, às vezes inevitável, de ingressar milhares de policiais para recompletamento de efetivo. Essa não é uma medida desejável. O ideal talvez fôsse o ingresso anual de 400 policiais militares. Mas também aí a coisa não é tão trivial porque as regras orçamentárias não permitem vincular por lei este tipo de proposta.

Todavia estamos trabalhando no sentido de convencer a todos da importância dessa medida. Já temos algum progresso também nesse aspecto, que poderá ser verificado na edição do PCS.

Por enquanto é isso. Outros comentários mais adiante.

quinta-feira, 23 de julho de 2009
O DISTRITO FEDERAL NO MODELO FEDERATIVO BRASILEIRO E SUAS REPERCUSSÕES PARA A INSTITUIÇÃO POLICIAL MILITAR


Ricardo da Fonseca Martins*



RESUMO

Este trabalho é uma reflexão sobre a questão da autonomia do Distrito Federal dentro do sistema federativo brasileiro e as conseqüências que existem para a instituição policial militar neste cenário. Trata-se de uma abordagem específica a partir dos marcos regulatórios vigentes e da doutrina sobre o tema federalismo.


Palavras-chave: federalismo, polícia militar, distrito federal, estados, autonomia, Constituição, lei orgânica, competência, Estado, estado, centralização, descentralização, institucional, entes federativos.



INTRODUÇÃO


Um dos princípios fundamentais da organização do Estado brasileiro estabelecido no artigo 1º. da Constituição afirma que o Brasil é uma “República Federativa”. Todavia ao se abordar o tema federalismo não se pode ter a percepção de que este conceito possui um significado absoluto. Valeriano Costa [1] (COSTA, 2007, p. 211), por exemplo, estabelece que o termo federalismo possui dois significados, que de um lado denota ideologia política para governar um Estado, seja pela idéia de centralização ou de descentralização do poder e por outro como uma forma de organizar concretamente as instituições.

Do ponto de vista conceitual tem-se então que federalismo sob a ótica da concentração e desconcentração do poder possui uma idéia mais geral de como os Estados federativos se fundamentam. Entretanto em uma visão institucional apresentam-se várias peculiaridades que não permitem admitir um traço único ao tratar do tema. Portanto é necessário identificar as particularidades do federalismo brasileiro, sobretudo as características do arranjo institucional, para que se possa entender o seu funcionamento.

Um componente fundamental para o entendimento do Estado Federativo Brasileiro é verificar a constituição institucional dos estados membros. É notório que existem muitas diferenças entre eles, mas é necessário saber o porquê dessas diferenças.

José Afonso da Silva [2] (SILVA, 2000, p. 475) entende que os estados são entidades típicas do Estado federal. São elas que asseguram a estrutura conceitual dessa forma de Estado. Sem eles não haveria federação. Todavia o que caracteriza a natureza não é o ente em si, mas o regime de autonomia. Assim a questão da autonomia dos entes da federação é um componente básico na construção institucional e na caracterização do sistema.

Valeriano Costa (COSTA, 2007, p. 211) afirma que é preciso estudar as instituições políticas e administrativas em todos os âmbitos da administração para que se possa entender como funciona realmente o federalismo em um país. Realmente a questão do federalismo não pode ser vista somente a partir de princípios gerais, é necessário que se busque identificar nas organizações do Estado como esses princípios estão presentes.

Surge então o foco desta abordagem: a questão da autonomia dos entes federativos é isonômica entre os estados membros e o Distrito Federal? Como isso se reflete no desenho institucional da União e dos entes federativos?
Vários doutrinadores do direito constitucional e da teoria geral do Estado identificam e estabelecem características fundamentais que caracterizam o Estado Federal. A união dos estados membros, a base jurídica constitucional, a inexistência do direito de secessão, a soberania do Estado Federal, o compartilhamento do poder político e, sobretudo, as atribuições da União e das unidades federativas fixadas nas competências contidas na Constituição Federal. Deste modo, o desenho institucional da composição dos governos será mais centralizado ou descentralizado conforme tais competências. Mais competências para os estados, mais descentralizado; mais competências para a União, mais centralizado.

Não se quer aqui argüir a partir das competências elencadas na Constituição Federal se o sistema federativo é mais ou menos centralizador. Há muitas teses controversas nesse sentido. Sabe-se, entretanto que é nesse modelo de competências, atribuições e autonomias que se equilibra o sistema e o Estado democrático de direito, que vem se consolidando desde 1988, quando o país adotou seu sistema democrático de organização estatal.

Ao se fazer, porém, uma verificação, ainda que a partir de um recorte específico, no elenco de competências dos entes da federação se pode constatar algumas diferenças. O ponto de partida há de ser a questão da autonomia e o conseqüente desenho institucional, e para tanto, adota-se como foco a Polícia Militar do Distrito Federal.


2. A POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL E SUA RELAÇÃO COM A AUTONOMIA DO DISTRITO FEDERAL

Chama a atenção dentre as peculiaridades institucionais a existência da unidade da Federação Distrito Federal, conforme preconiza o artigo 18 da Constituição Federal [3]·, e a configuração de sua autonomia político-administrativa.

Essa autonomia político-administrativa já teve historicamente outras configurações. O Distrito Federal, por exemplo, já foi administrado por um prefeito, estabelecendo uma similitude com os municípios, entretanto sempre com aspectos peculiares. Já teve nomeação pelo Presidente da República ao invés de eleição direta para o cargo de governador. Já foi legislada por uma comissão de três senadores da república ao invés de possuir um poder legislativo composto por deputados distritais. Mas para a discussão que se propõe, o que interessa é que com o estabelecimento do Estado democrático de direito, advindo da constituinte de 1988, o Distrito Federal foi alçado à condição de entidade membro da federação. Não é um estado, mas a ele se equipara. Não é um município, mas possui competência cumulativa deste em suas atribuições. É, portanto, um ente federativo especial.

No desdobramento dos preceitos da Constituição Federal, foi promulgada a Lei Orgânica do Distrito Federal [4] e seu artigo 1º. estabeleceu que O Distrito Federal possui pleno exercício de sua autonomia política, administrativa e financeira, observados os princípios constitucionais.

Ocorre que exatamente pelos princípios constitucionais se verifica uma autonomia distinta dos demais estados da federação, em alguns aspectos.

Valeriano Costa (COSTA, 2007, p.212) afirma que o grau de centralização ou descentralização do poder em um Estado federal depende da forma como funciona o poder central. Logo, o Distrito Federal, comparado com outras unidades da federação, possui uma autonomia mais restrita, portanto sendo um modelo mais voltado para a centralização do poder da União. Pode-se verificar o fenômeno em vários aspectos, mas o enfoque aqui é com relação à existência das instituições policiais e mais especificamente em relação à Polícia Militar do Distrito Federal.

As instituições policiais no Brasil foram disciplinadas no artigo 144 da Constituição Federal que estabelece:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

E mais adiante, o § 6º determina que a subordinação e o comando das corporações sejam exercidos pelos governadores dos estados e do Distrito Federal:

§ 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

Buscando especificar o conceito de autonomia socorre-se a José Afonso da Silva (SILVA, 2000, p. 104) que caracteriza a autonomia federativa assentada em dois elementos, quais sejam: independência dos órgãos federais quanto à forma de seleção e investidura e competências exclusivas que não sejam reduzidas. Logo, o mandamento constitucional constante dos dispositivos acima descritos, em tese, se adéqua à doutrina do autor citado.

Focando agora a questão da competência, Charles Durand (apud SILVA, 2000, p. 105) afirma que o federalismo se caracteriza por “um Estado, que embora aparecendo único nas relações internacionais, é constituído por estados membros dotados de autonomia, notadamente quanto ao exercício de capacidade normativa sobre matérias reservadas à sua competência.” Reforça-se a idéia de que um aspecto importante para o entendimento do desenho institucional de uma federação que é a atribuição de competência.

Porém ao se refletir sobre a subordinação da Polícia Militar, especificado na dispositivo citado acima e se comparar com aspectos de competência atribuídos na Constituição Federal, verifica-se, no que tange ao Distrito Federal, que contornos bastante diferentes dos estados membros da federação afloram.
Uma diferença clara está no preceito constitucional contido no artigo 21, inciso XIV que prevê que é competência da União organizar e manter a polícia civil, a militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal. Os demais membros da federação, estados, são competentes para organizar e manter suas polícias.

Assim sendo, verifica-se que os poderes constituídos do Distrito Federal não possuem competência para organizar suas polícias, e que o ordenamento jurídico confere essa competência à União.

Nesse sentido, atos normativos e de comando, que normalmente são exercidos pelos governadores e pelo legislativo em nível regional, no caso do Distrito Federal são compartilhados com o Presidente da República e com a câmara federal. Por exemplo, a política remuneratória da instituição polícia militar é de iniciativa do Presidente da República. O mesmo ocorre com as regras e requisitos de avaliação de desempenho para os processos de promoção, matéria eminentemente administrativa. O governador do Distrito Federal pratica os atos de promoção, mas as regras e critérios estão consubstanciados em norma federal, que teve origem no executivo federal.

É possível, pelas razões acima expostas, inferir, no que se refere ao Distrito Federal, que existe uma autonomia mais restrita nesta seara ao se comparar com os estados. Denota, portanto, uma maior concentração de poder nas mãos da União.
A concentração de poder na União normalmente tem sido justificada a partir do princípio da predominância do interesse geral nacional em detrimento do interesse regional ou local. Não parece ser o caso em questão, em razão de estar evidente que o interesse presente na hipótese é local, muito mais que regional. Tal concentração evidencia resquícios autoritários que concebem as forças policiais como aparelhos de controle do Estado em detrimento da concepção de que elas devam ser forças a serviço do cidadão.

Há quem possa defender a tese de que o interesse nacional está presente pelo fato do Distrito Federal abrigar os órgãos do poder central do Estado, e que, portanto as instituições policiais precisam se vincular de algum modo a esse poder central. Embora pareça uma situação forçada, admitindo esta hipótese, surge desse modo, a admissão de uma estrutura de subordinação híbrida. Ora encontra fundamento para o seu funcionamento no poder local ou regional, ora encontra fundamento no poder central, federal.

A título de exemplificação do quão específico isso se torna, tem-se que a lei que fixa os efetivos de policiais militares do Distrito Federal é de competência federal e o plano de articulação das unidades, isto é, a distribuição dos efetivos pelas diversas unidades da polícia militar, é realizada pelo poder local. Ou seja, o que se quer apontar é que o Governo do Distrito Federal pode criar unidades, conforme sua política de segurança pública, mas o preenchimento dos cargos dessas unidades depende de autorização federal para o provimento ou criação, já que é a União quem organiza e mantém a corporação.

Corrobora ainda essa condição de restrição de autonomia o preceito contido no § 4º. do artigo 32 da Constituição Federal que preconiza que lei federal disporá sobre a utilização, pelo Governo do Distrito Federal, das polícias civil e militar e do corpo de bombeiros. Portanto estamos diante da necessidade de uma autorização legal de nível federal para que o Governante do Distrito Federal possa empregar as forças policiais a ele subordinadas por força da Constituição Federal, ainda que tal lei ainda não tenha sido editada.

Assim, há quem apregoe por um lado, sob o ponto de vista da escassez dos recursos, que o governo do Distrito Federal goza de um privilégio de ter suas forças policiais custeadas pela União, através do fundo constitucional do Distrito Federal. Por outro, há aqueles que defendam a tese de que o Distrito Federal não possui poderes tão amplos quanto aos demais estados membros na condução das políticas de segurança públicas locais.

Evidentemente que esse cenário apresenta vantagens e desvantagens. Sob o ponto de vista da autonomia verifica-se existir certa restrição no comando e subordinação das referidas instituições. No entanto, no que se refere à integração da política nacional para a segurança pública à política local para essa função do Estado, o caminho está pavimentado para uma maior integração.

Há que se ressaltar ainda, que a existência de uma política nacional para a segurança pública mais consentânea com o Estado democrático de direito é fato muito recente. Até o ano 2000, o vínculo das policias militares se dava através do então Ministério do Exército, e essas forças representavam um aparelho de controle social do Estado. A própria constituição ainda estabelece que as polícias militares são reservas do exército, numa clara demonstração de restrição aos poderes conferidos aos governos estaduais. É possível que o desenho institucional ainda contenha resquícios de preocupação com o cumprimento do pacto federativo. Mas o remédio para isso também está na Constituição que prevê as hipóteses em que poderá haver intervenção nos estados e no Distrito Federal.

3. CONCLUSÃO

Pelo que se pode verificar existem diferenças no quesito autonomia quando se compara o Distrito Federal com outros entes federativos, pois a União concentrou mais competências em relação ao Distrito Federal, diferentemente do que ocorre nos estados membros da federação.

O desenho institucional do Distrito Federal, por essa razão apresenta contornos mais restritos quando comparado aos estados, fazendo surgir um sistema de compartilhamento híbrido, que estabelece relações mais próximas da União com o Distrito Federal e vice-versa.

A despeito da constatação, as crises de relacionamento entre o Distrito Federal e a União têm sido negociadas e as peculiaridades verificadas não chegam a afetar o equilíbrio do sistema federativo brasileiro. Se por um lado a autonomia é restringida pelo princípio que determina a organização da Polícia Militar do Distrito Federal pela União, por outro há uma compensação por essa perda de autonomia pela manutenção orçamentária e financeira das forças policiais do Distrito Federal também pela União. Valeriano Costa (COSTA, 2007, p. 212 e 218) já dizia que a vantagem do federalismo não consiste em eliminar a possibilidade de conflitos políticos entre os entes federativos, mas de se criar regras de resolução deles. Logo, é fato que há restrição de autonomia, mas por outro lado se verifica que a União financia muitas políticas regionais e locais. Esta tem sido a estratégia de solução de conflitos, já que dificilmente qualquer estado ou município é capaz de realizar suas políticas sem o apoio ou concordância do governo federal. Não tem sido diferente na segurança pública. Mas esse tema fica para outra conversa.

* Pós-Graduando do CIPAD – 7 /2008 da FGV
Coronel da Polícia Militar do Distrito Federal
Chefe da Assessoria Militar do Governo do Distrito Federal
Especialista em Gestão Estratégica em Segurança Pública
Universidade do Estado da Bahia – 2006
e-mail: martins011060@gmail.com


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

[1] COSTA, Valeriano. Federalismo. In AVELAR, Lúcia; CINTRA, Antonio. Sistema político brasileiro: uma introdução. – Rio de Janeiro: Fundação Konrad – Adenauer. UNESP, 2007. Cap 1, Parte 3. p. 211 – 223.

[2] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo, Malheiros, 2000. 18 ed. rev. atual.

[3] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Centro Gráfico do Senado, 1988.

[4] DISTRITO FEDERAL. Lei Orgânica do Distrito Federal. Vest-Con Editora, 1996.
domingo, 12 de julho de 2009


A Polícia Militar do Distrito Federal completou duzentos anos. Muita história, alguma conquista e muito que fazer.

No rastro do marco histórico um sonho antigo dos policiais-militares: plano de carreira, não pelo que ele pudesse representar para instituição, porém muito mais do que ele pode trazer de benefícios individuais. O termômetro tem indicado esta tendência: corrigir frustrações do passado na carreira. Todavia a conjuntura apresenta possibilidades muito maiores do que a importância egoísta: uma guinada na estrutura organizacional a partir do plano de carreira.

Gosto muito de usar clichês, frases de efeito e metáforas para fixar uma idéia. Tenho repetido que a ordem natural das coisas é o cachorro balançar o rabo, mas no caso concreto da PMDF é o rabo que vai balançar o cachorro.
De fato, o que está subjacente ao projeto do plano de carreira é uma sequência de pequenas reformas, que ao final terá a dimensão de reforma administrativa.

“Reforma administrativa: mudança de todos os dias.”


A ciência da administração tem evoluído muito. O pensamento administrativo vem saindo de uma orientação prescritiva, visão cartesiana, estrutura fechada, incentivos definidos, visão limitada do homem e poder centralizado surgido na revolução industrial no século XVIII, para o cenário em que vigora a orientação explicativa, visão holística da organização, estrutura aberta, incentivos flexíveis, visão valorizada do homem e trabalho organizado em equipes autônomas.

Como dar conta de inserir essas mudanças na nossa instituição?


Temos a percepção de que vivemos em ambiente de crise, caos e paradoxos. Fazemos esta autocrítica todos os dias. Só que não nos damos conta que este cenário é parte de nossa realidade, é o nosso material de trabalho. Entretanto é preciso ter em mente também que é necessário planejamento, sobretudo estratégico, para definir o rumo do progresso. E isso nos tem faltado. Mudamos ao sabor da crise do dia. Todos nossos projetos são tratados como uma ocorrência policial sob o prisma do gerenciamento de crises. Confundimos emergência com negligência, falta de planejamento, etc. Mas ainda assim mudamos, porque como dizia o poeta Luís de Camões: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades – Muda-se o ser, muda-se a esperança – Todo mundo é composto de mudança, - Tomando sempre novas qualidades. – Continuamente vemos novidades, - Diferentes em tudo da esperança; - Do mal ficam as mágoas na lembrança, - E do bem, se algum houve, as saudades. – O tempo cobre o chão de verde manto, - Que já coberto foi de neve fria, - E em mim converte em choro o doce canto. – E, afora este mudar-se a cada dia, - Outra mudança faz de mor espanto: - Que não se muda já como soía.”

Assim mudamos todos os dias.

Uma pesquisa feita pela empresa de auditorias denominada Price Waterhouse Coopers com duzentos executivos de sucesso no mundo resultou no livro chamado “Princípios de Paradoxos” e apontou para existência de cinco paradoxos na administração:
1. mudanças positivas exigem boa dose de estabilidade;
2. para construir uma organização é preciso focar o indivíduo;
3. tem que focar a cultura organizacional de forma direta e indireta;
4. a delegação de poderes requer uma liderança firme;
5. para construir é preciso destruir. Logicamente que cada um desses aspectos é desenvolvido no livro amplamente.

Mas para nós, neste momento basta imaginar o que isso significa e tentar pensar a nossa amada corporação.

O processo de mudança apresenta também algumas armadilhas:
1. Conceber a mudança como um processo geral, amplo, em que se tem que mudar tudo;
2. Não entender que a mudança ocorre quando se altera um registro crucial que provoca uma reação em cadeia;
3. Achar que mudanças ocorrem por acaso e
4. Desprezar um planejamento estratégico.

A PMDF hoje muda pelo projeto de capacitação do Policial do Futuro, pela adesão do GDF ao Sistema Único de Segurança Pública e pelo seu projeto de Plano de Cargos e Salários e vamos explicar o porquê dessa assertiva.

O projeto Policial do Futuro muda a cultura da instituição, ampliando os horizontes da organização e dos indivíduos que a compõe. A adesão ao SUSP nos coloca em um contexto nacional, forçando-nos a abandonar a nossa ilha de conforto. E o PCS nos indica o caminho da necessidade de mudanças na nossa organização básica, uma completa reengenharia institucional, reformas estatutárias, e no esteio destas várias outras como a reforma do sistema de ensino considerando o nível superior como eixo transversal em todos os quadros, etc.

No caso específico do projeto do plano de carreira, não tem sido fácil o processo, como também não se esperava que fosse.

No bojo de toda caminhada estão embutidos estratégias, decisões de consenso, avanços, inovações, atores diversos, mas também retrocessos.

A história deste tema na PMDF remete ao Projeto de Lei do Deputado Federal Alberto Fraga, que não logrou o êxito desejado. Entretanto, teve o mérito de colocar o assunto na pauta política do Distrito Federal e do Executivo Federal. Em 2007 o Governador José Roberto Arruda assumiu o compromisso público de desenvolver o projeto e nomeou uma comissão. O ato simbólico deste compromisso foi a reunião de policiais e bombeiros militares na Praça do Buriti. Em 2008 as corporações trabalharam em suas propostas institucionais e apresentaram o anteprojeto em 15 de novembro ao Governador. O projeto foi analisado por órgãos do governo do DF e em fevereiro de 2009 surge uma nova crise em razão do projeto das Unidades de Pronto Atendimento de Saúde (UPAS), situação nova no cenário e que provocou mudanças por parte do CBMDF e um retrocesso na discussão. Neste momento assume a coordenação do processo a Secretaria de Segurança Pública do DF. Em seguida o projeto é repercutido com assessores e políticos locais. Nova crise em razão de divergência de opiniões, e o Governador chama a si a coordenação do processo, estabelecendo nova comissão multidisciplinar para uma proposta possível. Finalmente em abril de 2009, após desgastante trabalho chegou-se a um texto de consenso, que não foi o ideal, sob o ponto de vista de muitos, mas o possível diante de tantos atores e obstáculos.

Algumas estratégias se evidenciaram como a adoção definitiva do nível superior nas corporações, a necessidade de consertar questões normativas, a realização de reformas administrativas e a opção por progredir em detrimento de crescer. Esta última estratégia é fundamental para o estabelecimento de um padrão de excelência do serviço prestado ao cidadão. As reiteradas decisões estratégicas de contratar mais pessoal e comprar mais viaturas e armamentos tem ocasionado repetir os mesmos padrões de policiamento e críticas, sucedendo à máxima de proporcionar mais do mesmo. Ou seja, estivemos sempre preocupados com a eficiência, sem mensurar a eficácia e a efetividade. Já passou da hora de mudar isso.

Outro ponto de dificuldade na construção do consenso é o grande número de atores que interferem no processo. Neste cenário estão as instituições militares do DF, políticos locais, políticos federais, órgãos do Distrito Federal, órgãos Federais, Tribunais de Contas (DF e União), Ministério Público, políticos de outros estados da federação, policias militares dos estados e particularmente dos ex-territórios e do antigo Distrito Federal, assessores, associações, lobistas, donos de cursinho, pessoal da ativa e da reserva, detratores, resmungões, enfim, muita gente. E ocorre que tudo isso é legítimo e faz parte do processo decisório democrático. É um erro crasso imaginar que haverá uma proposta que deverá prevalecer. O clima é de conflito, negociações, decisões por maioria e suas conseqüências, e assim segue. Quando se imagina que já se chegou a um consenso, aparece um novo ator gerando novo conflito e daí nova discussão, negociação, etc. Assim, a decisão será sempre política neste cenário e os técnicos são os que viabilizam a decisão.

Houve um momento no processo que foi necessário estabelecer diretrizes políticas para o encaminhamento da questão. Essas diretrizes foram emanadas pelo Governador do Distrito Federal com os seguintes pontos: plano único para PMDF e CBMDF; único sistema especificando postos e graduações; impacto máximo de 5% em 2009 em razão da crise mundial; que possibilitasse a reforma administrativa e que pudesse elastecer o tempo de serviço. Foi somente a partir deste ponto que se chegou a um consenso dentro do Distrito Federal, o que não quer dizer que seja unanimidade em outras instâncias.

O texto do plano permeia atualmente as conversas dentro e fora da corporação. Há muita crítica, mas também muita expectativa boa. Há muita fofoca, fomentada por quem não tem o que fazer, ou que acha que fazer fofoca é sua tarefa. Mas isso também faz parte do processo.

O fato é que o texto seguiu para a Presidência da República, onde deu entrada na Casa Civil. A seguir foi encaminhado ao Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão, onde foi exaustivamente discutido com a equipe técnica e o grupo de trabalho do GDF. Sofreu, naquele momento, algumas alterações, que não alteraram crucialmente a proposta original. Finda esta discussão foi remetido à Casa Civil da Presidência da República, onde novamente sofre uma análise apurada.

Imaginávamos que na Casa Civil houvesse mera ratificação dos pontos verificados pelo Ministério do Planejamento: engano. Exatamente naquela instância é que toda carga política de comparações foi realizada. Surgiram novos atores: assessores da Presidência da República, outros órgãos organizados pela União (Secretaria do Tesouro Nacional, Controladoria Geral do União, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Banco Central),Forças Armadas, que mesmo alguns sem saber estiveram presentes às rodadas de negociação.

Enfim, para sintetizar a enfadonha narrativa do processo de negociação, as equipes técnicas reduziram o conflito a três pontos cruciais, que só poderiam ser decididos no nível político:

1. Se o projeto segue por Medida Provisória ou projeto de lei;
2. Se o projeto das Unidades de Pronto Atendimento de Saúde (UPAS) dos bombeiros do DF pode ser recepcionado com suas inovações;
3. Se a questão do nível superior será tratada em novo dispositivo de lei ou se permanece nos moldes atuais, ou seja, o GDF define sobre este tema de acordo com seu juízo de oportunidade e conveniência.

Realizada reunião no dia 7 de julho de 2009, com a presença do Governador do DF, lideranças políticas locais e membros das comissões técnicas chegou-se ao consenso: serão apresentadas duas versões ao Presidente da República do projeto (Medida Provisória e Projeto de Lei) – tendência de ser MP, depende da decisão do Presidente - ; A questão das UPAS foi debatida e ao final foi afastada a possibilidade da criação do Quadro de Temporários e redimensionada para uma participação menor do Corpo de Bombeiros do DF no projeto, mas ainda dentro da visão de integração das políticas de saúde e segurança pública, como é orientação do Governador do DF; e finalmente a questão do ensino superior foi negociada para que permaneça sendo decidida dentro do poder discricionário do Governador do DF, uma vez que a assessoria técnica da Casa Civil acabou por estabelecer este ponto como sendo o mais crucial de todos. E por quê? Pergunta que pode causar surpresa a muitos.
O fato relevante a ser explicado refere-se aos atores. A União organiza e mantém seus órgãos e os órgãos da segurança pública do DF. Tivesse havido acordo quanto constar em lei o ensino superior para as forças de segurança pública militares do DF, outros órgãos mantidos pela União, e que também buscam este reconhecimento profissional teriam mais um instrumento de pressão sobre a Casa Civil da Presidência da República. Portanto, a Casa Civil utilizou a estratégia de impedir o estabelecimento em lei dessa realidade incontestável das forças militares do Distrito Federal no afã de conter as pressões internas dos órgãos da União que buscam esse avanço. Acresça-se a isso a comparação, a meu ver equivocada e medíocre, de que as polícias militares são forças reservas do Exército Brasileiro, e que por isso não poderiam ter organização e valorização diferente das Forças Armadas. Neste ponto são necessárias algumas explicações.

O sistema de Defesa Nacional e o funcionamento das Forças Armadas Brasileiras se apóiam na formação de reservistas. Assim, o cidadão que presta serviço militar obrigatório se converte em reservista. De igual modo, as Polícias Militares, por serem organizadas baseadas nos princípios da hierarquia e disciplina, acabam também sendo consideradas reservistas. Todavia não estamos falando de time de futebol que tem o titular e o reserva, que fica no banco aguardando para entrar em campo e jogar. As Policias Militares e os reservistas exercem suas atividades profissionais normalmente, e somente em caso de mobilização é que podem exercer atividades relacionadas com as Forças Armadas. Deste modo, especificamente as Polícias Militares pertencem em tempo de paz ao sistema de segurança pública dos estados e do Distrito Federal, e nada tem haver com as Forças Armadas. Quando alguém, inadvertidamente imagina que por serem reservas do Exército as Polícias Militares não podem perceber benefícios superiores aos das Forças Armadas, alguns equívocos se evidenciam. Primeiro: estão invadindo princípios basilares do pacto federativo, ou seja, há uma intromissão na competência dos estados, e em parte, no Distrito Federal. Segundo: pudesse prosperar esse tipo de raciocínio, nenhum cidadão brasileiro reservista poderia perceber salários e outros benefícios superiores ao que recebe um militar da União que possua grau hierárquico superior ao seu ao tempo em que esteve no serviço ativo. Seria a militarização da sociedade, cujo parâmetro seria a hierarquia das Forças Armadas. Absurdo! Ademais como ficaria a questão do inciso XIII do artigo 37 da Constituição Federal que veda a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público? Portanto não é razoável esse tipo de comparação, muito menos encontra qualquer supedâneo legal. Logo estamos falando de carreiras distintas, que possuem, quando muito, um único traço de identidade e que, portanto, não se verifica qualquer base de comparação dos seus misteres. Assim impedir que os militares estaduais não obtenham avanços em sua formação e carreira a conta de que as Forças Armadas não têm o mesmo padrão é no mínimo um equívoco, para não ser mais contundente. Acresça-se o fato de que outras unidades da federação já superaram há muito essa questão como foi o caso do Rio Grande do Sul e Goiás, só para exemplificar.

Todavia é conveniente enfatizar de que esse tipo de mentalidade tacanha permeia muitas cabeças, como por exemplo, a do Deputado Federal Jair Bolsonaro, autor da PEC 352 em tramitação no Congresso Nacional.

É necessário saber que esse tipo de pensamento ainda grassa por aí e deve ser combatido como abominável preconceito.

O relato que faço é somente no sentido de explicar a complexidade do processo. Por força do artigo 21, inciso XIV da Constituição Federal é de competência da União organizar a manter a PMDF e o CBMDF. Logo, a norma para nos organizar é federal, o que requer processo mais complexo, com a participação de mais atores. Divergências e entendimentos conflitantes são previsíveis, sempre. Esse desenho institucional híbrido, atrelado ao fato de que a lei prevista no § 4º. do artigo 32 não foi editada, remete à noção de que o Distrito Federal possui autonomia mais reduzida que as demais unidades da federação na administração de suas forças policiais. Talvez aí esteja a explicação para o fato de possuirmos ainda marcos regulatórios anacrônicos, defasados e desatualizados que tanto tem engessado a capacidade administrativa de nossa instituição, impedindo avanços importantes como a edição de regulamento de competências e atribuições, mapeamento e estabelecimento de macro-processos e processos, nova forma de organização e articulação, enfim uma série de medidas de gestão que muito contribuiria para a modernização da instituição.

No que concerne ás críticas, elas normalmente procuram apontar o que o projeto não tem. Esquecem de verificar o que ele tem. O plano estabeleceu nova divisão do efetivo dos policiais e bombeiros militares que permite um fluxo de carreira muito bom. Equalizou regras de promoções de oficiais e praças. Incentiva a permanência no serviço por mais tempo para os que desejarem. Modifica a estrutura piramidal das corporações, diminuindo os postos e graduações da base e aumentando os do meio e do topo. Resolve a questão do princípio da inocência para as promoções. Estabelece critérios objetivos nas avaliações de desempenho. Ajusta os interstícios á realidade da carreira, evitando frustrações. Estabelece a equivalência dos percentuais da Gratificação de Certificação Profissional dos cursos de oficiais e praças. Cria as condições para a reengenharia institucional de organização básica. Cria postos e graduações em quadros que estavam trancados. Permite o acesso ao QOPMA E QOPME mais cedo na carreira. Estabelece a exigência do curso de formação em todos os quadros. Procura solucionar uma série de problemas de regras estatutárias e de remuneração, daí ser efetivamente um plano de cargos e salários.

Como todos já percebemos a tarefa não é trivial. Por isso, precisamos estar vigilantes, interessados, participativos, enxergando o que há de bom na proposta, acompanhando os seus passos e neutralizando as resistências. A visão há de ser holística e não egoísta.

Enquanto continuamos a batalha para que ele seja entendido e respeitado, os órgãos de planejamento das instituições continuam trabalhando arduamente escrevendo as normas complementares, para que quando for finalmente editada a Medida Provisória ou Lei desejada, se possa buscar o aperfeiçoamento do processo, com a edição dos decretos necessários.

Por fim, em que pese o meu entusiasmo e compromisso institucional com este projeto, estou ciente de que ele não há de ser uma panacéia para todos os problemas das nossas instituições. O que vislumbro é uma grande oportunidade, proporcionada por todo esse efeito em cascata, em produzir mudanças importantes.

Outro dia, falando para os oficiais da PMDF creio haver citado que este momento nos permite construir uma nova polícia, e por isso fui contraditado por um valoroso oficial da reserva da corporação, que identificou no discurso a intenção de criar uma divisão entre o passado e o presente. Certamente que não me fiz entender, já que essa “nova polícia” sonhada e descrita como tal, permite cada vez mais a participação de todos, inclusive dos que se encontram na reserva, já que querendo, abre-se uma oportunidade para que estejam sempre participantes de todos os encaminhamentos da instituição, podendo inclusive ser designado para o serviço ativo, se assim desejar.

Somos tão mais fortes quanto mais unidos conseguirmos ser. Mas a união não é um estado de pensamentos, mas, principalmente, de ações. Precisamos adquirir a maturidade democrática de aderirmos e defendermos as decisões majoritárias sem sectarismos.


RICARDO DA FONSECA MARTINS – CORONEL PMDF

CHEFE DA ASSESORIA MILITAR DA CASA MILITAR DO GDF
MEMBRO E RELATOR DA COMISSÃO DO PCS
GERENTE DO PROJETO POLICIAL DO FUTURO

Brasília é você

Brasília Capital da Esperança – Nasci no Estado do Rio. Adotei Brasília. Os laços com a cidade se consolidaram ao longo de dezoito anos e percebi que ela não passa indiferente a ninguém. Quem a conhece e a compreende, a ama. Quem a ela não se adapta, a odeia. Quem não a conhece e dela fala mal, no fundo a inveja.

Existe uma confusão entre a cidade e o centro do poder: compreensível. Às vezes, quando visito um amigo em outro Estado, vem sempre a pergunta: E aí como está o Presidente? E os Deputados? E os ladrões do Congresso? Como seu eu privasse da intimidade dessas pessoas porque vivo em Brasília. Relevo a piada para não perder o amigo. Mas dá vontade de perguntar pelo Fernandinho, pelo Escadinha, pelo Menininho, pela Margaridinha, pelo Robertinho, pelo Paulinho e tanta gentinha mais.... Deixa pra lá, não tem a menor graça tripudiar....

A desilusão nacional, buscando a catarse de todas as suas frustrações, comete o erro crasso de confundir Brasília com as instituições que foram compostas por todo o povo brasileiro. É como se não tivessem mais responsabilidade pelos seus representantes, que foram eleitos em seus respectivos Estados. Delegam-nos a responsabilidade pelo que fizeram e ainda nos culpam por isso. Esquecem, por conveniência, que os votos das urnas de todo o país produziram a composição das atuais instituições. Brasília como centro de poder é mera depositária dessa vontade. Teima-se em não querer perceber que na devassidão estamos muito mais para o sofá.

Por isso, a população de Brasília, que continua tendo esperança e fazendo jus ao título da cidade, Capital da Esperança, roga ao povo brasileiro que no próximo ano não nos envie seus Robertos, Waldomiros, Severinos, Josés (em todas as suas variantes), Luises, Dudas, Valérios, Delúbios e tantos outros, como os execrados da safra atual. Já será grande a tarefa de escolher os nossos representantes, cujos pecados não debitamos a conta de ninguém.

Ajude-nos a manter a cidade como patrimônio da humanidade, e mais que isso, como patrimônio de todos os brasileiros.

I - INTRODUÇÃO

As mazelas sociais, políticas e econômicas do Brasil foram capazes de produzir um cenário de insegurança, crime e violência que tem assolado a população brasileira. Inúmeros eventos criminosos ocorridos, muitos caracterizados como violentos outros como ligados ao crime organizado e tantos outros mais de natureza de criminalidade comum têm chocado o país, que parece ter sido acometido por uma fleuma causada por essa endemia de violência.

Muitas pessoas afirmam que a violência, que degenera a sociedade, foi capaz de tirar a capacidade de indignação das pessoas. Mas o fato é que a sociedade está gritando por socorro e isso tem sido possível de ser identificado em muitas expressões leigas, científicas e artísticas. Os fatos violentos ocorrem cada vez mais a nossa volta, quando não ocorrem conosco, e a realidade bate às nossas portas. As discussões sobre segurança pública permeiam desde os assuntos de bate-papo da esquina nos bairros até os centros de debates científicos e acadêmicos. A mídia reverbera diariamente novos crimes e atos violentos deixando indefinidamente o tema segurança pública na ordem do dia.

Nesse cenário a polícia acaba assumindo um papel de protagonista, seja pela expectativa que se deposita nela para liderar a solução dos problemas, seja pelos crimes e violência que ela mesma gera. Nasce nesse contexto dialético a relação polícia e sociedade. Discute-se hoje, como sempre se discutiu a questão da profissionalização das polícias que “... no Brasil, caminhou na direção contrária ao princípio de isenção do Estado e das instituições que o compõe.” (BASTOS NETO, 2006, p. 261). Pode-se dizer que hoje é possível se desenhar o perfil de uma polícia que se quer, e que ainda falta bastante para ser alcançada.

II – DESENVOLVIMENTO

Ao se abordar os problemas relacionados com a profissionalização da polícia, um tema, invariavelmente vêm à baila: a polícia é mal formada para o seu mister. Não é de hoje que se ouve que a polícia é mal formada, mal preparada.

O caminho que leva para a formação policial “adequada” passa necessariamente pelo estabelecimento de uma política que estruture a formação policial. Historicamente no Brasil as políticas de segurança pública têm-se reduzido a aumentar efetivos, adquirirem-se viaturas, armas e equipamentos e aumentar salários, quando possível, principalmente depois dos governos militares. A questão da formação profissional geralmente foi tratada a partir de padrões alienígenas, através de acordos de cooperação internacional, que refletia os interesses do país que dava o suporte em detrimento das necessidades internas. Esses colaboradores fizeram a cabeça da polícia brasileira.

Segundo Bastos Neto (2006, p. 258) “é difícil, inclusive, determinar quando surge a polícia mesmo que na sua versão moderna”. Entretanto, fazendo um corte epistemológico para o período analisado por Huggins (1998), verifica-se que a questão da formação remonta aos idos de 1906. “Em 1906, os franceses foram chamados ao Estado de São Paulo, pelo Governador Jorge Tibiriçá. Os franceses queriam conter a influência alemã na América Latina, ganhar influência política e ideológica no Brasil, e assegurar para seu país um status privilegiado no comércio...” (FERNANDES, 1974, apud, HUGGINS, 1998, p.40). Verifica-se historicamente que esse recurso de solicitar ajuda internacional para a profissionalização da polícia é um fato bastante antigo, e que se repetiu ao longo de décadas, principalmente com a duradoura cooperação estadunidense que moldou o perfil profissional do policial brasileiro que serviu até o fim do governo militar, e que ainda refletem na formação atual, posto que o que se seguiu a esse período foi uma fase de ausência de política para a profissionalização do policial brasileiro.

A Constituição de 1988, ao tratar da segurança pública, instituiu a descentralização e o controle das forças de segurança para que os Estados Federados as administrassem, talvez na tentativa de elidir a pecha de polícia política que essas forças tiveram durante a centralização no regime militar. Isso, no entanto, vem a corroborar a tese defendida por Huggins de que a profissionalização policial sofre a influência de uma espécie de movimento pendular, que ora tende a centralização e ora tende a descentralização ou privatização em meio a processos de degeneração motivada por vários fatores. Em suma, qualquer que seja o modelo o desgaste é inevitável em razão dos problemas e conseqüências advindas, assim como pelo aparecimento de novas demandas sociais em termos de segurança.

Após o período do regime militar a política de segurança pública viveu uma espécie de limbo, conseqüência do repúdio social ao modelo de polícia repressora, política, violenta, engajada em uma doutrina de Segurança Nacional, preocupada em atender somente às demandas do Estado. “A confusão entre segurança pública e segurança nacional não foi mero acaso e para manter a ordem, na iminência da desordem, foi e ainda é preciso uma polícia política” (BASTOS NETO, 2006, p. 258). Ficou muito claro qual o modelo que não se queria, mas não se estabeleceu um padrão para as forças de segurança do Brasil. Cada Estado da Federação, por conta de sua competência constitucional, adotou uma política medíocre de profissionalização de suas polícias ao passo que o crime se organizou, a criminalidade cresceu, sofisticou-se e globalizou-se, expandindo seus domínios entre estados e países, e a violência recrudesceu. Resultado: a situação da segurança pública se evidenciou desorganizada e atingiu a um estágio de crise intensa, como a que se vive atualmente. “O que o cidadão comum não consegue entender é que os sistemas de segurança pública dos estados membros da federação, já faz muito tempo, não atendem às necessidades mais prementes da situação real” (BASTOS NETO, 2006, p. 269).

A partir de 1998 surge a primeira providência institucional no sentido de se alavancar uma política nacional de segurança pública que foi a criação da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP). Num primeiro momento este novo órgão, vinculado ao Ministério de Justiça e não mais a um ministério militar, serviu de ponte de repasse de recursos da União para os Estados para investimento em segurança pública e apresentou um arremedo de um sistema de informação centralizado (INFOSEG) e um Plano Nacional de Segurança Pública. Com a instauração de um novo governo em 2003, novo Plano Nacional de Segurança Pública é elaborado, desta feita sob a forma de planejamento estratégico, com a implantação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), com o estabelecimento de sete ações estruturantes (Gestão do Conhecimento e informações criminais, Formação e valorização profissional das forças de segurança pública, Gestão das organizações, Programas de Prevenção, Estruturação e Modernização da Perícia, Controle Externo e Participação Social e Ações para redução da violência). Seguem-se as assinaturas de convênios com os Estados para adesão ao SUSP, já que os entes federados são autônomos e responsáveis cada qual por sua política de segurança pública. Todos aderem no interesse de acesso aos investimentos federais. Tudo isso para delinear que se quer uma estrutura policial democrática que, como dizia Monet (apud BASTOS NETO, 2006, p. 260), “é mais um slogan ou um voto de confiança que uma realidade”. A polícia há de ser cidadã, integrada, comunitária, científica, que usa métodos de inteligência, respeitadora de direitos humanos, consciente do seu papel social, etc. Ademais, os diagnósticos apontam para a certeza de que não se combate o crime organizado sem a existência de uma estrutura coordenada, integrada ou mesmo centralizada. Isso deu uma direção estratégica para a polícia que se quer, que supostamente a sociedade almeja, pela legitimação do mandato político concedido aos governantes.

A formação profissional vem no bojo dessas medidas, agora com uma ação estruturante nascida de um plano estratégico e dos planos de ação conseqüentes. A preocupação é com uma reforma estrutural das polícias da qual possa emergir valores éticos, de respeito aos direitos humanos, apartados de aspectos degenerativos de corrupção, criminalidade, etc. Trata-se de um afastamento claro dos padrões degenerados que vigoraram durante o regime militar, cujos resquícios permanecem até hoje. É um ideal utópico que se insere no contexto de visão que comporta um planejamento estratégico, mas que pode sofrer uma grande crítica a partir da análise do cenário, onde se identificam fatores que contribuem favorável e desfavoravelmente para consecução dos objetivos. O que se quer dizer é que a visão é de surgimento de instituições éticas, “preparadas”, legalistas, etc a partir de uma sociedade envolvida em vários níveis com o crime organizado, atos de corrupção. Constitui-se no ressurgimento de uma outra fênix.

A questão da integração se apresenta como a panacéia para muitos dos males da segurança pública, o que pode ser entendido também dentro da visão do movimento pendular descrito acima, como a busca novamente de um padrão de polícia centralizada, desta vez sob o manto de uma doutrina de integração interinstitucional. Mas que suas ações estejam voltadas ao atendimento das necessidades dos cidadãos, portanto privatizada, não agindo tão-somente no interesse do Estado, o que evidencia uma postura autoritária. Esse complexo modelo desenhado evidencia paradoxos e contradições que estão relacionados diretamente com o problema de se equacionar liberdade, ideal democrático, e interesse público, supremacia do Estado em detrimento do cidadão. Nesse contexto já se pode perceber uma crise de identidade entre o exercício da autoridade conferida e a missão de servir, não a sociedade, mas ao cidadão.

As forças de segurança pública estão nesse processo buscando sua nova identidade e se adequando ao novo modelo proposto, o que não é tarefa simples. Até porque “a necessidade de modernização das polícias não se confronta com os interesses policiais e sim com interesses políticos” (BASTOS NESTO, 2006, p. 270). Somente para exemplificar: o governo federal propõe a estruturação de uma polícia comunitária, cidadã e ao mesmo tempo reúne policiais dos estados federados em torno de um projeto de uma força de segurança pública nacional como instrumento de controle social do Estado Brasileiro. Afinal a vocação é comunitária ou estatal? Parece que os últimos episódios de atentados criminosos contra a segurança pública, como os que ocorreram em São Paulo recentemente, começam a degenerar o padrão de polícia comunitária, que nem mesmo chegou a ser implantada como doutrina consolidada. Estava-se indo na direção do pêndulo que tendia para uma polícia democrática e ele já volta indicando ou justificando a existência de alguns padrões autoritários em razão do quadro social que muda. É de se refletir sobre as questões propostas por Huggins no posfácio de seu trabalho (1998, p. 237):

Mais do que propor uma série de respostas, este estudo sugeriu grande número de indagações inquietantes. Onde termina a dialética da centralização e da degenerescência? A forma persecutória, uma vez institucionalmente estabelecida, produzirá algum dia de maneira plena um Estado não-persecutório? Um Estado baseado em uma chantagem protecionista pode ser substituído por outro fundado na legitimidade política popular? Podem os Estados democráticos antigos e os emergentes conservar sua legitimidade democrática enquanto vendem proteção policial?

Reconheça-se que essa tem sido uma tentativa séria na busca de soluções, em termos de planejamento, que poderá render bons frutos. Mas há que se ressaltar que não é só com planejamento que se faz uma política deslanchar. É necessário que se agreguem outros elementos e um deles é investimento. E essa contrapartida, considerando os graves problemas assinalados, parece ser objeto de retórica, já que os recursos para investimento no SUSP vem diminuindo ano após ano nos orçamentos apresentados, sem contar os contingenciamentos impostos a cada ano, conforme se verifica no relatório sobre o sistema de segurança único produzido pela própria SENASP.

Enfim, formação policial é um mote que permite inúmeras abordagens diferentes e complexas, e que certamente é um elemento chave para a constituição de um modelo policial desejado.


III - CONCLUSÃO

É necessário, portanto, que se considere que a formação policial ideal reflete, ou deveria refletir, o que a sociedade quer para si. Logo a formação é um caminho para se chegar a esse ideal.

Não se pode ter a pretensão de que a formação, ainda que tenha a capacidade transformadora pelo conhecimento, seja capaz de por si só modificar o sistema de segurança pública do Brasil e forjar um super-herói policial. Ela há de ser uma das ferramentas para atingir esse objetivo. Os problemas são mais complexos e exigem muitas outras medidas.

A questão da formação será sempre um problema na medida em que não existe um modelo pronto, ideal, imutável. As novas demandas sociais farão com que um determinado modelo esteja defasado, anacrônico, ultrapassado nesse processo de eterna evolução. Assim, o modelo de polícia autoritária que servia aos propósitos da política de segurança nacional dos governos militares e aos propósitos da política internacional estadunidense não era de uma polícia mal formada, ao contrário serviu muito bem a tais propósitos.

Nesse contexto, a formação estará sempre a reboque dos propósitos, anseios e da degenerescência que vem a ocasionar esse movimento pendular, ora tendendo a centralização, ora tendendo a descentralização; ora tendendo ao atendimento dos interesses do Estado, ora tendendo aos interesses privados dos cidadãos; ora democrática, ora autoritária. “A mudança de mentalidades, de concepções morais e por conseqüência o surgimento de novas interpretações e leis a respeito do crime contribuíram, sobremaneira, para as mudanças nos perfis de atuação da polícia” (BASTOS NETO, 2006, p. 259), e por via de conseqüência na mudança do processo de formação dos policiais. Daí a queixa de que a formação policial nunca é adequada para os padrões exigidos para a sociedade.


THE IMPORTANCE OF THE POLICE EDUCATION FOR THE PUBLIC SAFETY

ABSTRACT


This Paper is elaborated with the purpose to evaluate and to discuss the importance of the formation and training programs used by police forces in Brazil, in a professional level, considering the fact that now a days Public Safety in our country is under a process of establishment of a new policy, where the education process is considered as one of the various strategies to reach public safety purposes.

PALAVRAS CHAVES: formação profissional, política de segurança pública, financiamento, centralização, direitos humanos, democrática, autoritária, perfil, formação policial, SENASP, SUSP.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASTOS NETO, Osvaldo. Introdução à segurança pública como segurança social: uma hermenêutica do crime. Salvador: Ler, 2006.

HUGGINS, Martha K. Polícia e Política: relações Estados Unidos/América Latina. Tradução Lólio Lourenço de Oliveira. São Paulo: Cortez, 1998.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, SENASP. Relatório de atividades de implantação do Sistema Único de Segurança Pública. Brasília, 2006.

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